Gestão de Projetos Ágeis na Engenharia & Construção
Os métodos ágeis chegaram para ficar.
Sua disseminação foi na indústria de software e de fato o método ágil quebra paradigmas, principalmente contratuais, na busca por entregar o que é preciso (Mais valor), considerando também o dinamismo das vontades dos Clientes (que muda uma vez que estamos cada vez mais imersos no tal mundo volátil, o famoso mundo VUCA – Volatility (volatilidade), Uncertainty (incerteza), Complexity (complexidade) e Ambiguity (ambiguidade).
Para discutir sobre um método, é importante ter em mente seus princípios, nos quais está apoiado.
1 – Geração de valor:
“Nossa maior prioridade é satisfazer o cliente, através da entrega adiantada e contínua de software de valor.”
2- Flexibilidade:
“Aceitar mudanças de requisitos, mesmo no fim do desenvolvimento. Processos ágeis se adequam a mudanças, para que o cliente possa tirar vantagens competitivas.”
3- Frequência:
“Entregar o software em funcionamento com frequência, seja na escala de semanas ou meses, dando preferência a períodos mais curtos.”
4- União:
“Tanto pessoas relacionadas a negócios como desenvolvedores devem trabalhar em conjunto, diariamente, durante todo o curso do projeto”.
5- Motivação:
“Construir projetos em torno de indivíduos motivados, dando a eles o ambiente e o suporte necessário e confiando neles para fazer o trabalho.”
6- Comunicação:
“O método mais eficiente e eficaz de transmitir informações para e entre uma equipe de desenvolvimento é por meio de conversa face a face”
7- Funcionalidade:
“Software funcionando é a medida primária de progresso.”
8- Sustentabilidade:
“Os processos ágeis promovem desenvolvimento sustentável. Os patrocinadores, desenvolvedores e usuários devem ser capazes de manter um ritmo constante indefinidamente.”
9- Revisão:
“Contínua atenção à excelência técnica e bom design, aumenta a agilidade.”
10- Simplicidade:
“A arte de maximizar a quantidade de trabalho que não precisou ser feito.”
11- Organização:
“As melhores arquiteturas, requisitos e designs emergem de times auto-organizáveis.”
12- Autoavaliação:
“Em intervalos regulares, o time reflete em como ficar mais efetivo, então, se ajustam e otimizam seu comportamento de acordo”
O ambiente de engenharia e construção, principalmente no Brasil, é muito carente de métodos eficazes de gestão.
Temos sim na construção procedimentos operacionais consolidados. Dominamos como fazer um bom concreto, um bom asfalto, uma boa solda, um bom lançamento de cabos, um bom içamento de cargas.
Mas temos que ter a humildade de dizer que ainda temos muito a crescer quando necessitamos integrar todos esses processos operacionais.
Outro dedo na ferida que vou colocar: o brasileiro e o latino americano em geral não são bons de colaboração. Também temos muito a crescer nesse campo. E entendam, isto não é um demérito para nós, as pessoas, os brasileiros e latino americanos. Pois para colaborar, também existe (e é preciso) método, e quando não temos, passamos a agir por instinto nos nossos projetos.
Viemos de uma sociedade baseada no código escrito (Code Law), herança romana que permanece viva nas veias de nossa sociedade até hoje, e que faz com que nossos povos tenham dificuldade para conviver com incertezas. Isto nos torna mais propícios a cadeias de comando e controle, onde a incerteza é abordada por quem está acima, ao invés de ser uma atividade comum a todos, como é o caso de sociedades baseadas em um código comum (common law).
Na engenharia & construção, temos o bom e velho cronograma. Que sempre nos ajudou a delimitar bem o escopo de trabalho (pela derivação da EAP) e a monitorar a meta de prazo. E aqui eu queria reforçar um grande ponto desse artigo. O bom é velho cronograma nunca deixará de ser útil nos projetos de construção.
A construção não se resolve do dia para a noite, envolve muitas preocupações com segurança e qualidade, e ainda necessita estar extremamente alinhada com os requisitos legais do poder público (fundiários e ambientais).
Os projetos de construção são de médio e longo prazo. E com os custos da construção cada vez mais inflacionados como temos visto, o domínio do tempo (tal como Deus grego Chronus) continuará a ser necessário. Um atraso de 1 dia no final do cronograma, desbalanceia equações financeiras dos empreendimentos, equações estas cada vez mais enxutas e exigentes.
Existe sim o exagero, “passar do ponto”, que não raramente acabamos caindo em nossos projetos. Devemos lembrar que quando entramos num projeto, o grande objetivo é entregar o produto. Se estou tento que fazer um enorme esforço de gestão, se tenho muitos pontos cegos nos processos, ou mesmo muitas sobreposições, com certeza há algo de errado. Vou dar um grande exemplo: um cronograma de obra (não importa o tamanho do empreendimento) que já nasça antes da mobilização do canteiro, com 10.000 linhas entre WBS e atividades.
Isto é um indicador simples. E um erro tentador de cair. Quando fazemos isso, caímos num plano determinístico, para um tipo de projeto, como a construção, com uma série de descobertas a acontecer a frente. E também concebemos um monstro a gerenciar. Um grande filho para tomarmos conta durante todo o tempo do projeto.
Estamos num ambiente onde dependemos de fornecedores, da qualidade da mão de obra, da facilidade e didática de comunicação, de relacionamento com comunidades, de fazer uma boa comida para a turma da obra, de certificar EPI’s de tempos em tempos, etc.
Então, é importante ter essa consciência: devemos refletir e parar de programar o improgramável.
Acredito que é aí que as metodologias ágeis entram certeiras na construção. O caminho para ele é pavimentado a partir de um bom senso razoável na hora de se elaborar o cronograma do empreendimento, somado ao espírito de colaboração que os princípios do método ágil trazem.
Para ser mais prático, quando falamos do dia a dia de gestão de obra, a partir de um cronograma enxuto que traduza bem o escopo do empreendimento, obviamente com durações bem calculadas, caminho crítico claro e marcos bem estabelecidos para proporcionar a execução das ondas sucessivas, os métodos ágeis assumiriam o processo pegando elementos do cronograma para serem quebrados e produzidos, e preferencialmente nas tais ondas.
Qual a grande consequência disso? Estamos dando mais autonomia às equipes de Produção, Planejamento, Suprimentos, Manutenção, Engenharia, Qualidade, Segurança, Meio Ambiente, Custos, Administração, etc. Entende-se que a construção já não é mais puramente preditiva, sendo possível agora enxergar sim no ciclo de vida da obra incrementos e iterações, descobrimento de impedimentos e resolução deles com foco no cliente, a cada interação.
Para isso todos terão de entender profundamente o cronograma, e a partir do conhecimento dos seus processos internos, gerar as entregas incrementais que farão o escopo da obra como um todo ser concluído.
E todos terão que se reunir (com periodicidades diferentes) para analisar o cronograma gerencial, selecionar as entregas que estão no horizonte mais próximo, e colocá-las em rotinas de curto prazo para serem detalhadas e entregues.
Reparem que voltei a um ponto importante do nosso início: “todos terão que se reunir de maneira periódica”. Ou seja, todos terão que colaborar.
Falando de um dos métodos ágeis, no scrum, temos 3 papéis importantes: a equipe que realiza as entregas, o Scrum Master que facilita as rotinas dentro do método, e o Product Owner que dá a direção das entregas.
Assim como o bom e velho cronograma, que ainda é necessário e se funde com as rotinas ágeis, o Gerente de Projetos não sai de cena.
As habilidades do Gerente de Projetos foram, são e serão fundamentais na Construção para se dar uma direção para o projeto. Os skills de comunicação, gerenciamento de riscos, gestão de recursos e sobretudo, integração, foram, são e sempre serão essenciais. E aliado a isso, é importante estarmos atentos a evolução das melhores práticas. A 7ª edição do PMBOK caminha justamente neste sentido com as mudanças de configuração de Grupos de Processos e Áreas de Conhecimento para Princípios do Gerenciamento (12) e Domínios de Desempenho (8).
Fechando essa “primeira onda de entrega”, este é mais um incomodo que devemos criar (nos nossos próprios processos) para a engenharia & construção inovar e melhorar de forma contínua seus métodos de gestão. É válido também lembrar que quando falamos de métodos ágeis, o scrum citado aqui não é o único passível de utilização. Existem rotinas específicas para o ambiente de construção, tal como o Lean Construction, que possui uma importante abordagem em seu framework quanto às restrições operacionais da Construção.
Com toda certeza há ainda um grande espaço para colaborarmos mais nos nossos projetos de construção. E fazendo isso a partir de um método estruturado e inserido dentro de um contexto, a chance de sucesso será ainda maior.
Autor: João Cunha, Senior Consultant of Capital Projects and Infrastructure na VerumPartners