Há décadas os contratos tradicionais têm sido vastamente utilizados em projetos com diferentes níveis de complexidade e tamanho. Isto é, complexos desde a ótica da contratante para desenvolver, executar e operar o empreendimento. E, por outro lado, a caraterística do tamanho, considerando a extensão geográfica e investimento.

Assim, os dois contratos convencionais mais usados na indústria da construção são o Design-Bid-Build (DBB)[1] e Design-Build (BD)[2], do qual deriva o Engineering, Procurement and Construction (EPC)[3] e Engineering, Procurement and Construction Management (ECPM)[4]. Importante destacar que dentre os principais problemas destes contratos encontram-se:

(i) assimetria de informação entre as partes;

(ii) dificuldade para alocar riscos e atribuição de culpa;

(iii) excessivos mecanismos contratuais punitivos;

(iv) transparência na definição responsabilidades e o que é colaboração entre as partes;

(v) resistência às mudanças no projeto.

 

Agilidade na prática

Ao mesmo tempo estamos vendo uma nova forma de trabalho emergindo desde a criação do Manifesto Ágil em 2000, com a aplicação de práticas ágeis nas mais diversas áreas, indo desde a gestão operacional e de projetos, até mesmo à forma que fazemos negócios com o Business Agility e contratos ágeis. Essa nova forma de trabalho é em muito impulsionada pelas demandas crescentes de um mercado cada vez mais complexo e imprevisível, no qual os times buscam ter flexibilidade suficiente para responder às mudanças, colaborando mais com o cliente e entregando valor mesmo em ambientes onde as premissas contratuais não foram previstas.

Dessa forma a agilidade aplicada à gestão de contratos busca justamente fazer jus aos princípios do manifesto, i.e: indivíduos e interações, colaboração com o cliente, resposta a mudanças e produto em funcionamento. Dentro desse contexto entra o conceito de “esforço” e Sprints[6]. Ao invés de tentar prever todos os serviços que serão necessários ou tentar definir uma carga “hora-homem” os contratos ágeis buscam utilizar uma escala de esforço ponderado, onde cada atividade pode receber um peso e o valor contratado refere-se a uma quantidade de esforço, e não a um escopo fixo.

Na prática contratada e contratante acordam intervalos fixos de iteração para desenvolverem o trabalho, dentro desse período uma quantidade de esforço é definida para ser trabalhada. A escala para tal esforço depende do acordo entre ambas as partes, uma das escalas mais famosas é a sequência de Fibonacci ( 1,2,3,5,8,13). Desta forma o esforço acordado é um número dentro dessa escala, tal como os serviços que serão prestados.

Ao começo de cada interação o time prioriza quais atividades irão constar Sprint, com a aprovação da contratante, os esforços das atividades somadas devem dar o valor de que foi acordado no contrato.  Isso permite que o cliente possa alterar o escopo, sem que para isso precise alterar o contrato. Como exemplo:

13 pontos de esforço podem referir-se a serviços de peso 8 e 5, ou a um único serviço de peso 13. Conforme variações forem ocorrendo e o caminho da construção sofra alterações, o time pode optar por adotar tais alterações desde que elas não alterem o número de esforço programado para aquela interação. Assim caso surja uma nova atividade com esforço “A” ela poderá ser trocada por outra atividade de igual esforço “A” sem prejuízo ao contrato.

Na prática o contrato responde melhor às mudanças, aproxima as partes envolvidas a trabalharem junto na identificação dos escopos, garante a entrega de valor desde as primeiras etapas, além de facilitar a identificação de riscos e facilitar a comunicação entre as partes.

Desta maneira, quando se trata de realizar o pagamento em troca de valor, podemos citar vários casos dentro da construção em que esta abordagem contratual se enquadra. Por exemplo, podemos mencionar as contratações feitas durante a etapa de desenvolvimento do projeto – fase de engenharia-. Nesta etapa, maiormente o avanço financeiro do serviço é medido por entrega de documentos, sejam estes desenhos em 2D, modelos 3D, lista de quantitativos, Especificações Técnicas, dentre outros. Ou seja, o desembolso do dinheiro é realizado depois da entrega de valor para o usuário final – contratante ou cliente-.

Desta forma, através dos contratos ágeis, a troca da entrega de valor e o dinheiro é aprimorada, priorizando as entregas, dividindo riscos, outorgando prêmios por entregas antecipadas e otimizações, realizando verificações recorrentes e enxugando o cronograma incialmente proposto pelas contratadas.

É neste ponto onde surgem algumas dúvidas de como tangibilizar todos os princípios da agilidade dentro de um contrato, acompanhar a gestão do contrato e, ainda mais, gerar a colaboração entre as partes – sim, incluindo a contratante-. Pois bem, a metodologia Advanced Work Packaging (AWP) é uma das formas que pode facilitar estes objetivos. Isto é, o AWP na fase de engenharia empacota as entregas de valor com caraterísticas definidas.  No caso, estes são denominados em inglês como Engineering Work Package (EWP)[7]. Através destes pacotes, as rotinas de gestão e documentação atrelada à metodologia, a contratada consegue priorizar, designar, promover a colaboração, estabelecer marcos de entrega. definir o termo de aceite das entregas e divisão de lucros, caso houver alguma otimização no desenvolvimento do projeto – Engenharia de Valor-.

Sem dúvida, uma descrição robusta da requisição técnica, especificações técnicas e o uso do BIM, podem ser complementos importantes e necessários para almejar ganhos.  No entanto, ainda existem projetistas e clientes que tem um baixo grau de maturidade e expertise no assunto, os quais podem obter suporte de consultorias externas, acelerando o processo de mudança e mermando a carga administrativa para adoção deste tipo de contratos.

Contratos ágeis são mecanismos importantes utilizados por organizações que estão navegando em ambientes complexos e precisam ter flexibilidade na tomada de decisão, respondendo rápido às mudanças e garantindo a colaboração entre as partes. Quando associado à práticas como o AWP tais contratos permitem não apenas uma maior previsibilidade, como também alavancam os resultados dos investimentos a cada interação, garantindo flexibilidade de mudanças, sem causar prejuízos às partes, mantendo o valor entregue e a saúde financeira de ambas as partes envolvidas.

 

[1] Em português Desenho-Licitação-Construção
[2] Em português Desenho-Construção
[3] Em português Engenharia, procura e construção
[4] Em português Engenharia, procura e administração da construção
[5] Bussiness Agility é a o nome que se dá a aplicação do ágil nas atividades operacionais de negócio
[6] Sprint são períodos de interação, pré-determinados onde o time desenvolve o escopo de trabalho
[7] Um Pacote de Trabalho de Engenharia (EWP) como uma entrega de engenharia que é usada para desenvolver Pacotes de Construção (CWPs). O escopo do trabalho é tipicamente por disciplina por área. O conteúdo típico de um EWP é desenhos, listas de materiais, escopo do trabalho, requisitos de permissão de trabalho, especificações de projeto, dados do fornecedor, plano geral de mudanças, avaliação de mudanças, dentre outros.

 

Autores: Brian Oliveros, Senior Consultant of Capital Projects and Infrastructure e Raphael Costa, Agile Coach na VerumPartners