É comum defendermos o uso de uma boa prática tendo por base os benefícios que ela traz, porém é válido lembrar das consequências por vezes geradas ao ‘se abrir mão’ de tais benefícios e o que pode ser perdido quando deixamos de utilizar uma prática já consolidada no mercado.

Muitas vezes, o uso da metodologia BIM e seus processos são erroneamente associados a uma simples maquete eletrônica ou modelo 3D, limitando assim a engenharia digital a uma mera funcionalidade associada ao seu desenvolvimento, e deixando de lado um conjunto de práticas fundamentais para a correta integração e funcionamento de uma obra.

Neste artigo que teve como base um estudo de caso realizado por nossa consultoria, listamos alguns dos principais desvios apontados em projetos de Capital e Infraestrutura referentes à utilização, ou à tentativa de utilização mal sucedida do BIM.

O modelo BIM

Em nosso entendimento a elaboração de um projeto em BIM compreende a aplicação de propriedades e atributos que permitam gerar dados suficientes para a Gestão de planejamento e da engenharia, considerando recursos como extração de quantitativos, classes e famílias dos materiais.

Chuck Eastman (2014) define que BIM (Building Information Modeling) pode ser conceituado como:

(…)Um modelo de construção produzido por uma ferramenta BIM pode dar suporte a múltiplas vistas diferentes dos dados contidos dentro de um conjunto de desenhos, incluindo 2D e 3D. Um modelo pode ser descrito por seu conteúdo (quais objetos ele descreve) ou por suas capacidades (a que tipos de requisitos de informação ele pode dar suporte). A última abordagem é preferível, porque ela define o que se pode fazer com o modelo em vez de como a base de dados é construída (que varia com cada implementação). Para o propósito deste livro, definimos BIM como uma tecnologia de modelagem e um conjunto associado de processos para produzir, comunicar e analisar modelos de construção. Modelos de construção são caracterizados por:

      • Componentes de construção, que são representados com representações digitais inteligentes (objetos) que “sabem” o que eles são, e que podem ser associados com atributos (gráficos e de dados) computáveis e regras paramétricas.
      • Componentes que incluem dados que descrevem como eles se comportam,

conforme são necessários poro análises e processos de trabalho, por exemplo,

quantificação, especificação e análise energéticas.

      • Dados consistentes e não redundantes de forma que as modificações nos dados

dos componentes sejam representados em as visualizações dos componentes.

      • Dados coordenados de forma que as visualizações de um modelo sejam

representados de maneiro coordenado.

EASTMAN, C. Manual de BIM: Um Guia de modelagem da informação da construção para Arquitetos, Engenheiros, Gerentes, Construtores e Incorporadores. Tradução Cervantes Gonçalves Ayres Filho. Porto Alegre: Bookman, 2014

Ainda que as documentações de contratações em BIM e normas vigentes, orientem o nível de qualidade necessário para a aplicação dos projetos em BIM, assim como ferramentas necessárias e programações, uma série de desvios são muito comuns na elaboração de projetos em BIM.

Seguindo esse conceito, espera-se assim então que a aplicação prática do BIM tenha minimamente essas características citadas acima.

Desvio 01 – Modelo não federado

É comum em projetos de capital e infraestrutura que diversas equipes de especialistas trabalhem em diferentes disciplinas e frentes do projeto, como hidráulica, terraplanagem, arquitetura, estruturas e elétrica. O termo “Modelo Federado” refere-se à união compatibilizada dos modelos  das disciplinas do projeto, em um único arquivo ou ambiente virtual que represente graficamente o empreendimento. Essa ‘unificação’ multidisciplinar deve ser capaz de permitir a interoperabilidade entre tais disciplinas, ou seja, permitir da forma mais transparente possível a comunicação entre as áreas que modelam cada uma dessas disciplinas, facilitando a comunicação, colaboração e compatibilização do projeto.

Modelos não federados corretamente dificultam não apenas a colaboração multidisciplinar, como também deixam de representar de forma fidedigna o projeto. O resultado é um modelo digital desconfigurado das características físicas que deveriam representar o que se pretende do projeto real.

BIM

Figura 1- Ambientes flutuam no espaço sem estarem conectados, fugindo de uma representação fidedigna do projeto

Desvio 02 – Nível de detalhamento

Quando falamos de BIM é comum utilizarmos os termos LOD – Level of Development, que nada mais é do que o nível de desenvolvimento e detalhamento de um projeto, uma escala que demonstra a confiabilidade do modelo. Tal escala demonstra até que nível as informações do modelo podem ser utilizadas para tomada de decisão em um determinado momento do ciclo de vida do projeto.

Quanto maior o LOD, maior o nível de detalhamento. Assim é comum que por exemplo, LOD 100 represente um elemento em fase de estudo preliminar, enquanto LOD 300 represente um elemento para fins de Projeto Detalhado. Ainda assim encontra-se equívocos de detalhamento onde o LOD não corresponde ao que foi especificado em um PEB (Plano de Execução BIM), como Paredes que não correspondem à realidade, faltando detalhamento de alvenaria, emboço, reboco e pintura e dificultando ou até mesmo impossibilitando a extração de informações importantes como referências e quantitativos.

 

Desvio 03 – Modelo não georreferenciado

Muito associado ao Desvio 01, por vezes o modelo não possui um georreferenciamento correto, o que pode implicar em uma série de problemas subsequentes para o projeto. Não apenas dificulta a compatibilização entre as diversas disciplinas que compõe o projeto, como também a depender da área do projeto pode inclusive indicar erros no próprio projeto de engenharia, como exemplo:

Terraplanagem – impossibilidade de representar serviços de escavação em planejamento

Estruturas – Dificuldade ou impossibilidade de se analisar pontos de interferência na estrutura, como aberturas nas almas de vigas metálicas, ou conexões de eletrocalhas nas mesas inferiores das vigas.

Elementos Hidráulicos – Elevações incoerentes com a realidade, podendo causar impactos diretos no projeto como drenagem incorreta.

Desvio 04 – Ausência de elementos relevantes

Também muito associado ao Desvio 02, sendo por vezes consequência dele e um impacto direto tanto no orçamento quanto no próprio desempenho do projeto. A ausência de elementos pode estar tanto associada à expertise e nível de maturidade da projetista, quanto à falta de clareza do que é necessário ao desenvolvimento da modelagem naquela etapa.

No exemplo abaixo vemos um sistema HVAC com ausência de curvas nos dutos.

Figura 2- sistema HVAC com ausência de curvas nos dutos

Desvio 05 – Modelagem desconectada do cronograma

Uma das partes mais importantes ao se trabalhar BIM associado a metodologia AWP é a definição das CWA’s no cronograma, uma vez que delas saíram EWP’s e PWP’s que serão desdobradas ao longo do projeto. Por vezes a modelagem não representa corretamente a CWA definida no cronograma, gerando impactos direto no Caminho da Construção (POC). No estudo de caso em questão foi possível identificar inclusive a presença de blocos modelados ‘atravessando’ áreas distintas das que foram definidas no planejamento.

Conclusão – o que se perde na obra

Os desvios supracitados possuem impactos diretos na obra, especialmente impossibilitando usos do BIM para fins de:

  • PLANEJAMENTO DA CONSTRUÇÃO(BIM 4D/5D) – Para planejar, organizar ou testar atividades da construção em função de restrições (ex.: cronograma, recursos disponíveis, materiais, etc.) os elementos modelados teriam que possibilitar o vínculo único com um cronograma de execução baseado em pacotes de instalação.)
  • ACOMPANHAMENTO DA OBRA – Para permitir o acompanhamento da evolução e medição das atividades executadas na obra o modelo BIM 4D/5D teria que ser estruturado e associado ao cronograma e aos custos aprovados, e só assim possibilitaria por meio do uso do BIM o cálculo do avanço das atividades de acordo com a porcentagem de avanço da atividade, o cálculo da medição daquele avanço, e a sinalização do status de cada atividade conforme cores dos elementos do modelo.
  • ANÁLISE DE CONSTRUTIBILIDADE – Possui como finalidade a revisão dos processos construtivos durante a etapa de projeto. O objetivo desta análise seria identificar potenciais obstáculos, falhas de projeto, gargalos na execução e extrapolação orçamentária. Para este uso, os elementos modelados teriam que possibilitar o agrupamento por pacotes de instalação para a análise geométrica e de peso considerando o método construtivo.
  • DOCUMENTAÇÃO 2D –  As extrações a partir dos modelos não refletiriam os projetos em 2D já emitidos e adotados pela obra

 

  • EXTRAÇÃO DE QUANTITATIVOS – Para calcular a quantidade de mobiliários, equipamentos ou materiais construtivos com intuito de produzir estimativas de custo, cada elemento modelado teria que possuir informações de código de serviço conforme lista do SPE, material e quantidades para a extração de listas de materiais e quantitativos de serviços possibilitando apoiar a orçamentação.

 

  • ESTIMATIVAS DE CUSTO – Para gerar estudos de viabilidade e comparar diferentes alternativas orçamentárias, cada elemento modelado teria que possuir informações de quantidades suficientes para o cálculo de quantidades de forma paramétrica, baseada em índices.

 

Muito mais do que um conjunto de processos, o BIM também é uma tecnologia voltada para a integração multidisciplinar que compreende todo o ciclo de vida de um projeto, e embora seja algo relativamente novo na história da construção, sua necessidade além de reforçada pelo decreto nº 10.306, de 2 de abril de 2020, é inerente para busca da qualidade final de qualquer projeto.

 

A Verum Partners tem larga experiência em implantação de BIM, Lean, Cultura Ágil, e metodologia AWP como a base para o gerenciamento de seus projetos, explorando a capacidade dessa metodologia de abranger todas as áreas de conhecimento e níveis de gerenciamento, sendo base para a integração entre engenharia, suprimentos, construção e comissionamento. Temos os melhores profissionais do mercado. Somos parceiros de verdade na alavancagem dos seus negócios!
Autores: 
Dominique Mansur, Champion of Capital Projects and Infrastructure na VerumPartners
Raphael Costa, Consultor de Excelência Operacional na VerumPartners.